PARÓQUIAS DE NISA
Domingo, 28 de fevereiro de 2021
II semana da quaresma
LITURGIA
DOMINGO II DA QUARESMA
Roxo – Ofício próprio (Semana II do Saltério).
+ Missa própria, Credo, pf. próprio.
L 1 Gen 22, 1-2. 9a. 10-13. 15-18; Sal 115 (116), 10 e 15. 16-17. 18-19
L 2 Rom 8, 31b-34
Ev Mc 9, 2-10
* Proibidas todas as Missas de defuntos, mesmo a exequial.
* Nas Dioceses de Cabo Verde – Ofertório para a Cáritas Diocesana.
* II Vésp. do domingo – Compl. dep. II Vésp. dom.
Em Portugal – Lembrar aos fiéis que, no
próximo domingo, o ofertório é para a Cáritas Portuguesa.
MISSA
ANTÍFONA DE ENTRADA Salmo
26, 8-9
Diz-me o coração: «Procurai a face do Senhor».
A vossa face, Senhor, eu procuro;
não escondais de mim o vosso rosto.
Ou cf. Salmo 24, 6.3.22
Lembrai-vos, Senhor, das vossas misericórdias
e das vossas graças que são eternas.
Não triunfe sobre nós o inimigo.
Senhor, livrai-nos de todo o mal.
Não se diz o Glória.
ORAÇÃO COLECTA
Deus de infinita bondade,
que nos mandais ouvir o vosso amado Filho,
fortalecei-nos com o alimento interior da vossa palavra,
de modo que, purificado o nosso olhar espiritual,
possamos alegrar-nos um dia na visão da vossa glória.
Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho,
que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
LEITURA I Gen 22, 1-2.9a.10-13.15-18
O sacrifício do nosso Patriarca Abraão
Leitura do Livro
do Génesis
Naqueles dias, Deus quis pôr à prova
Abraão e chamou-o: «Abraão!». Ele respondeu: «Aqui estou». Deus disse: «Toma o
teu filho, o teu único filho, a quem tanto amas, Isaac, e vai à terra de Moriá,
onde o oferecerás em holocausto, num dos montes que Eu te indicar. Quando
chegaram ao local designado por Deus, Abraão levantou um altar e colocou a lenha
sobre ele. Depois, estendendo a mão, puxou do cutelo para degolar o filho. Mas
o Anjo do Senhor gritou-lhe do alto do Céu: «Abraão, Abraão!». «Aqui estou,
Senhor», respondeu ele. O Anjo prosseguiu: «Não levantes a mão contra o menino,
não lhe faças mal algum. Agora sei que na verdade temes a Deus, uma vez que não
Me recusaste o teu filho, o teu filho único». Abraão ergueu os olhos e viu
atrás de si um carneiro, preso pelos chifres num silvado. Foi buscá-lo e
ofereceu-o em holocausto, em vez do filho. O Anjo do Senhor chamou Abraão do
Céu pela segunda vez e disse-lhe: «Por Mim próprio te juro – oráculo do Senhor
– já que assim procedeste e não Me recusaste o teu filho, o teu filho único,
abençoar-te-ei e multiplicarei a tua descendência como as estrelas do céu e
como a areia das praias do mar, e a tua descendência conquistará as portas das
cidades inimigas. Porque obedeceste à minha voz, na tua descendência serão
abençoadas todas as nações da terra».
Palavra do Senhor.
SALMO RESPONSORIAL Salmo 115 (116), 10 e 15. 16-17.18-19 (R.
Salmo 114 (115), 9)
Refrão: Andarei na presença do Senhor
sobre a terra dos vivos. Repete-se
Ou: Caminharei na terra dos vivos
na presença do Senhor. Repete-se
Confiei no Senhor, mesmo quando disse:
«Sou um homem de todo infeliz».
É preciosa aos olhos do Senhor
a morte dos seus fiéis. Refrão
Senhor, sou vosso servo, filho da vossa serva:
quebrastes as minhas cadeias.
Oferecer-Vos-ei um sacrifício de louvor,
invocando, Senhor, o vosso nome. Refrão
Cumprirei as minhas promessas ao Senhor
na presença de todo o povo,
nos átrios da casa do Senhor,
dentro dos teus muros, Jerusalém. Refrão
LEITURA II Rom 8, 31b-34
«Deus não poupou o seu próprio Filho»
Leitura da
Epístola do apóstolo São Paulo aos Romanos
Irmãos: Se Deus está por nós, quem estará contra nós? Deus, que não poupou o
seu próprio Filho, mas O entregou à morte por todos nós, como não havia de nos
dar, com Ele, todas as coisas? Quem acusará os eleitos de Deus, se Deus os
justifica? E quem os condenará, se Cristo morreu e, mais ainda, ressuscitou,
está à direita de Deus e intercede por nós?
Palavra do Senhor.
ACLAMAÇÃO ANTES DO EVANGELHO
Refrão: Louvor a Vós, Jesus Cristo, Rei da eterna glória. Repete-se
No meio da nuvem luminosa, ouviu-se a voz do Pai:
«Este é o meu Filho muito amado: escutai-O». Refrão
EVANGELHO Mc 9, 2-10
«Este é o meu Filho muito amado»
Evangelho de Nosso
Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele tempo, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e subiu só com eles para
um lugar retirado num alto monte e transfigurou-Se diante deles. As suas vestes
tornaram-se resplandecentes, de tal brancura que nenhum lavadeiro sobre a terra
as poderia assim branquear. Apareceram-lhes Moisés e Elias, conversando com
Jesus. Pedro tomou a palavra e disse a Jesus: «Mestre, como é bom estarmos
aqui! Façamos três tendas: uma para Ti, outra para Moisés, outra para Elias». Não
sabia o que dizia, pois estavam atemorizados. Veio então uma nuvem que os
cobriu com a sua sombra e da nuvem fez-se ouvir uma voz: «Este é o meu Filho
muito amado: escutai-O». De repente, olhando em redor, não viram mais ninguém,
a não ser Jesus, sozinho com eles. Ao descerem do monte, Jesus ordenou-lhes que
não contassem a ninguém o que tinham visto, enquanto o Filho do homem não
ressuscitasse dos mortos. Eles guardaram a recomendação, mas perguntavam entre
si o que seria ressuscitar dos mortos.
Palavra da salvação.
Diz-se o Credo.
ORAÇÃO SOBRE AS OBLATAS
Esta oblação, Senhor, lave os nossos pecados
e santifique o corpo e o espírito dos vossos fiéis,
para celebrarmos dignamente as festas pascais.
Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho,
que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
PREFÁCIO A transfiguração do Senhor
V. O Senhor esteja convosco.
R. Ele está no meio de nós.
V. Corações ao alto.
R. O nosso coração está em Deus.
V. Dêmos graças ao Senhor nosso Deus.
R. É nosso dever, é nossa salvação.
Senhor, Pai santo, Deus eterno e omnipotente,
é verdadeiramente nosso dever, é nossa salvação
dar-Vos graças, sempre e em toda a parte,
por Cristo nosso Senhor.
Depois de anunciar aos discípulos a sua morte,
manifestou-lhes no monte santo o esplendor da sua glória,
para mostrar, com o testemunho da Lei e dos Profetas,
que pela sua paixão alcançaria a glória da ressurreição.
Por isso, com os Anjos e os Santos do Céu,
proclamamos na terra a vossa glória,
cantando numa só voz:
Santo, Santo, Santo.
ANTÍFONA DA COMUNHÃO Mt 17, 5
Este é o meu Filho muito amado,
no qual pus as minhas complacências.
Escutai-O.
ORAÇÃO DEPOIS DA COMUNHÃO
Alimentados nestes gloriosos mistérios,
nós Vos damos graças, Senhor,
porque, vivendo ainda na terra,
nos fazeis participantes dos bens do Céu.
Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho,
que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
MÉTODO
DE ORAÇÃO BÍBLICA:
1.
Leitura: - Lê, respeita, situa o que lês.
- Detém-te
no conteúdo de fé e da passagem que leste
2.
Meditação: - Interioriza,
dialoga, atualiza o que leste.
- Deixa
que a passagem da Palavra de Deus que leste “leia a tua vida” 2020.11.28
3.
Oração: - Louva o Senhor, suplica, escuta.
-
Dirige-te a Deus que te falou através da Sua Palavra.
LEITURAS: Gen 22, 1-2.9a.10-13.15-18 : Depois
da história de Noé, no domingo passado, lemos hoje a história de Abraão e do
sacrifício de seu filho Isaac, sobre o monte Moriá. Mas Deus nunca quis
sacrifícios humanos. Abraão demonstrou a sua vontade de completa obediência a
Deus e recuperou o seu filho, vivo, que assim se tornou uma figura de Cristo na
sua ressurreição.
Rom 8, 31b-34: Esta
leitura mostra como Jesus realiza até ao fim a figura de Isaac, anunciada na
leitura anterior, e como o amor de Abraão é imagem do amor infinito de Deus
pelos homens. Deus, que não quis que Abraão Lhe oferecesse o filho em
sacrifício, permitiu que o seu muito amado filho Jesus fosse sacrificado, em
expiação dos nossos pecados. De facto, toda a história da salvação atinge o seu
ponto mais alto em Nosso Senhor Jesus Cristo.
Mc 9, 2-10 :A
Transfiguração, lida neste Domingo, depois de, no Domingo anterior, ter sido
escutada a tentação, faz com ela, como que num grande painel de duas alas, uma
espécie de grande abertura da Quaresma: mortificação e glorificação, tentação e
glória, morte e ressurreição; são elas, de facto, a síntese do Mistério Pascal
que vamos celebrar na Páscoa. Jesus vive em Si o mistério que a sua Igreja
agora celebra, e que ela viverá até à sua própria Transfiguração.
AGENDA DO DIA
11.30 horas: Missa em
Nisa, transmitida através do facebook (Endereço: Zona Pastoral de Nisa)
A VOZ DO PASTOR:
UM GENERAL FURIBUNDO RENDIDO À EVIDÊNCIA
Muito antes do
tempo dos afonsinhos, há cerca de três mil anos mais segundo menos segundo,
Israel sofreu as passas do Algarve com a Síria, ao tempo uma grande potência.
Neste tempo da Quaresma em que cada um é
convidado a guerrear-se contra as adversas potências interiores, é bom
reconhecer a capacidade de resistência e deitar mão das armas que conduzam à
vitória. Porque o testemunho, negativo ou positivo, de outros nos pode ajudar
nessa tarefa, hoje apresento-lhes um belo exemplar.
Nos tempos referidos,
o exército da Assíria era comandado por Naamã, um grande estratega, muito
aplaudido e confiante nas suas próprias forças. Um dia, porém, a doença
bateu-lhe à porta, ficou fraco e leproso. A lepra, uma das doenças mais antigas
da humanidade, era uma doença terrível, não só pelos danos ao corpo, mas também
porque era atribuída a libertinagens, pecados, castigos divinos, e sei lá mais
o quê!... Sem cura e contagiosa, ela reclamava o afastamento da comunidade,
osso duro de roer e ruminar , mas era assim, um grilhão difícil de suportar. E
que fazer agora com o ilustre general? O que não fazer? Como sair desta? Eis a
questão!... Sim, essa era a questão de Naamã e dos seus. E qual será a nossa
questão nestas pelejas da Quaresma?
Quando as tropas da Assíria
atacaram Israel, levaram, prisioneira, uma jovenzinha, que ficou ao serviço da
esposa de Naamã. Sem ressentimentos por ter sido deportada - apanágio dos
simples e humildes! -, esta jovem compadeceu-se do doente e falou à sua patroa, que, em Israel, havia um
senhor, o profeta Eliseu, que seria capaz de o curar. Naamã, talvez incrédulo, .contou
ao rei da Assíria o que esta menina havia dito à sua esposa. O rei animou
Naamã, e, como já nesse tempo as havia, até lhe meteu uma cunha: “Vá. Eu lhe
darei uma carta que você entregará ao rei de Israel”. Animado pela sugestão da jovem, feliz pelo
empurrão do rei, confiante na possibilidade de recuperar a saúde, o general lá
partiu, ele e a sua comitiva. Ao chegar ao destino, logo entrega a carta ao rei
de Israel, que dizia: “Quando receber esta carta, verá que lhe mando o meu
servo Naamã para que o cure da lepra”. Ora, não se reconhecendo com capacidade
de curar fosse quem fosse, o rei de Israel ficou com os azeites, “rasgou as próprias
vestes”, diz o texto. Como gato escaldado de água fria tem medo, pensou que
aquilo era uma engenhosa cilada do rei da Assíria para o tramar. E foi o cabo
dos trabalhos!
Entretanto, Eliseu, o homem de Deus, soube que o seu rei, o rei de
Israel, estava em apuros, não sabia o que fazer perante aquela comitiva
reforçada pela cunha do rei da Assíria. Então, Eliseu comunicou ao rei de
Israel que mandasse o general assírio ter com ele. Ó pernas para que vos
quero!... Dito e feito, o rei, em jeito de quem lhe saiu a sorte grande e mais
qualquer coisa, logo despachou Naamã e toda a comitiva ao encontro de Eliseu. Eliseu,
porém, se queria dizer ao rei de Israel que na sua própria terra existia um
profeta, também quis usar de pedagogia para com o importante general assírio.
Encheu-se de nove horas, empoleirou-se, fez-se caro, não apareceu para recebeu
pessoalmente o famoso militar. E se não o mandou aos ninhos, mandou alguém dizer-lhe que fosse tomar banho,
que fosse mergulhar-se no rio e ficaria curado: “Vai, lava-te sete vezes no Jordão, e
a tua carne será restaurada, ficarás limpo” (2
Reis 5,10). Naamã, um general de gabarito, de tantos pergaminhos e feitos
heroicos, sentiu-se humilhado, não gostou, ficou aborrecido e bravo. Esperava
um acolhimento pessoal e delicado da parte do profeta e, com certeza, pensaria
que ele fizesse para ali umas mezinhas, o curasse e mandasse embora são e salvo,
tal como hoje, infelizmente, até entre cristãos, ainda se procura no ler ou
deitar das cartas, no bruxedo, magos, adivinhos e quejandos a solução para os
problemas da vida. Não sendo assim, e tendo-o ele mandado mergulhar no rio
Jordão, Naamã bateu o pé e prendeu o burrinho, qual criança caprichosa. Como se
não bastasse, casquinou para quem quis ouvir que, na sua terra, havia rios
muito mais importantes que aquele e com águas muito mais cristalinas que essas.
Apressado e a rabujar, pôs os pés a caminho para se ir embora e mandar o
profeta à fava. Como afirmava Clemente XIV, “nada mais pequeno do que um grande
dominado pelo orgulho”, o que até dá espetáculo digno de se admirar, pela
negativa! Podemos imaginar a fita deste senhor, que, cheio de importâncias balofas, superioridades presumidas e
preconceitos injustos, até no pedir se manifestava pretensioso e a querer
mandar, seguro que estava no seu amor próprio de quem se julga sempre com razão!
Os membros da sua comitiva, embora apreciando a tensão do momento, estavam mais racionais e mais frescos para resistir ao embate. Encaixaram o recado de Eliseu e deitaram água na fervura de Naamã. Porque não era coisa difícil, convenceram Naamã a que, mesmo contrariado, descesse ao rio e se banhasse. Naamã, talvez com vontade bélica de armar ali mais uma guerra e enfiar o profeta e os presentes na barca de Caronte, cedeu à força de persuasão dos seus servos. Mesmo contrariado, lá foi mergulhar sete vezes no Jordão.
Se o profeta foi “malandro” para o fazer descer à terra, aquilo que para Naamã não fazia sentido e seria uma humilhação, foi o que realmente o curou. Só quando saiu dos seus búnqueres e castelos de defesa, só quando desceu das suas importâncias e orgulho pátrio, só quando resolveu deixar-se de preconceitos e aceitar o que lhe era proposto, é que foi curado. Vendo-se recauchutado e novo, ficou sem jeito por ter reagido como reagiu e desfaz-se em salamaleques. Fez um ato de fé no Deus único de Israel, reconheceu Eliseu como aquele que mostra a presença de Deus no meio do povo e quis dar-lhe um valioso presente, com o qual vinha prevenido. Eliseu, mesmo perante a insistência do general, não aceitou. O general promete deixar a idolatria e, doravante, só prestar culto ao Deus de Israel, o único que pode curar e a quem se sentia profundamente grato pelo facto de o ter tornado um homem verdadeiramente novo. E parte, feliz e saudável, reiterando fidelidade ao Senhor Deus de Israel e, agora humildemente, pedindo terra, terra dali, terra que carregasse duas mulas, para, lá, na Assíria, sobre essa terra, levantar um altar ao Deus único.
Deus
faz-se encontrado através duma lógica muito diferente da nossa lógica. Ele
serve-se das coisas mais díspares e insignificantes para nos dizer que está
presente e atento. Quem crê em Deus e acredita que Ele pode restaurar o centro
e as periferias da sua vida, não pode ter a pretensão de lhe querer dar ordens,
de lhe querer dizer como é que Ele deve fazer, apoiado em egocentrismos que
destroem. Nem deve encaprichar só porque Ele não age como se gostaria que
agisse. Essa atitude seria sinal de que não estamos dispostos a deixar as nossas
razões e importâncias, as nossas rotinas e seguranças, sendo julgadas, por nós
e só por nós, como verdadeiro caminho de fidelidade e salvação. Mas será que
serão se não estamos dispostos a fazer o que Ele pede, tal como aconteceu com o
referido general? Este queria impor-lhe como é que Ele haveria de fazer. Também
pode acontecer que permaneçamos ensonados ou fossilizados nessas rotinas
egocêntricas, vivendo instalados na idolatria e na indiferença, julgando-nos
não só bons, mas os primeiros entre os bons, sentindo-nos até com razões para
exigir de Deus o bom e o melhor, e da forma que nós entendemos. Se assim for, não
passaremos de cristãos de meia-tigela. Mesmo que difícil e em revolta, o
general acabou por fazer caminho e ficar curado, no corpo e no espírito, não
como resultado de um ritual mágico nas águas do Jordão, mas como fruto da ação
salvífica de Deus que atuou através da palavra do profeta. É interessante
reparar que foi aquela jovenzinha, escrava no estrangeiro, que iniciou o
processo. Ultrapassou fronteiras, apontou o Deus único capaz de curar e dar a
vida. Também foram os humildes servos do general que o ajudaram a seguir a
palavra do profeta. Se estamos desafiados à humildade e à conversão,
reconheçamos também quanto bem podemos fazer anunciando Aquele que cura e dá a Vida.
A Quaresma não é só para os outros,
também é para nós!
Antonino Dias
Portalegre-Castelo
Branco, 26-02-2021.
.
*************************
QUARESMA -
“SAÍA D’ELE UMA FORÇA QUE A TODOS CURAVA”
Na Igreja, a
Quaresma é, por natureza, um tempo catecumenal, um tempo de descoberta e
redescoberta da fé cristã como relação vital de absoluta confiança no Senhor
Jesus Cristo. Aliás, a Páscoa, celebração da revelação plena de Cristo para
onde a Quaresma nos conduz, só ganhará densidade espiritual e existencial se a
Quaresma se assumir como caminho e exercício de descoberta e redescoberta da
relação com Jesus Cristo. A condição humana, cada um de nós, surpreende-se,
comove-se diante de Jesus Cristo. Ele é, ao mesmo tempo, tão nosso e tão de
Deus, tão humano e tão divino, tão histórico e tão do Céu e da eternidade.
Antes de nos dizermos, já Ele nos conhece. Antes de lhe pedirmos, já Ele se nos
disponibilizou. Com a sua palavra e os seus gestos de proximidade, cativa-nos.
Com o mistério da sua Pessoa, colhe o nosso afeto, a nossa inteligência, a
nossa vontade. Tocados pela sua humanidade, tornamo-nos, por bênção sua,
capazes de tocar a sua divindade. Assim, rendidos e livres, estabelecemos com
Ele uma relação vital de absoluta confiança, por onde, doravante, passará a
vida toda. D’Ele brota uma força que não deixa ninguém indiferente e cura todos
os males.
A fé não é,
portanto, uma invenção de religiões. Nenhuma imposição a conseguiria legitimar.
Nenhuma lei a conseguiria impor. Nenhum moralismo a conseguiria justificar e
ser seu alicerce. Nenhuma tradição, por si só, a conseguiria manter. Tudo isso
seriam insuficiências, andaimes solitários sem construção a erguer. Dom
recebido e resposta dada, a fé cristã vai buscar muitas das suas dinâmicas mais
elementares à vida humana. Mas é na surpresa graciosa do encontro com o dom de
Deus em Jesus Cristo que ela se radica como atitude e ritmo. É esta fé, vivida
como bênção, presença de Cristo sentida ao nosso lado, é esta fé que vai
atravessar a nossa vida com as suas graças e desgraças, os seus encantos e
desesperos, as suas alegrias e tristezas. É esta fé, vivida como bênção, que
purifica a nossa vida com paixão, com graciosidade e com ousadia profética de
batizados. É o nosso batismo, que o mesmo é dizer a nossa fé, que está em causa
em cada Quaresma. Conversão e penitência, jejum, esmola e oração são exercícios
batismais da nossa vida cristã porque são expressão da nossa vital confiança em
Jesus Cristo e da nossa reação ao tempo e aos modos da vida.
A pandemia
que atravessamos pode ser bem o contexto de humanidade em que a nossa fé é
chamada a redescobrir-se e a dar fruto. Exigidas pela situação de crise, há um
conjunto de ações que, nos crentes, são autênticos imperativos de consciência
da vida cristã: na solidão, saber ser presença construtiva e não escravo da
desconfiança; no desespero, saber ser força de esperança; na doença, saber ser
cuidador; na dificuldade económica ou social, saber partilhar e promover; na
prossecução do bem comum, saber comprometer-se e fazer caminho em comum; nas palavras,
saber edificar e promover a verdade; nas atitudes quotidianas, saber eleger e
construir a justiça; nas relações pessoais e de cidadania, saber respeitar e
acolher. A pandemia, com a doença e a pressão que exerce em toda a sociedade,
pode tornar-nos hipersensíveis, facilmente descarriláveis e irascíveis. Pode
pressionar-nos e trazer constrangimentos vários à nossa vida. E é aí que é
necessário ter sempre Cristo diante dos olhos, ter sempre Cristo no coração e
nas mãos. Os cristãos não temos de ser uma maioria social, percentual, para
sermos uma maioria virtuosa. Podemos até ser uma minoria, mas, sem nos
acanharmos e ganharmos complexo de seita, saberemos ser Igreja à dimensão do
mundo e à dimensão do próprio Cristo.
Este ano, e
por vontade do Papa Francisco, conjugam-se com a nossa Quaresma o Ano da
“Família Amoris Laetitia” e o Ano de S. José. Na sua Carta Apostólica para este
ano, o Papa Francisco diz-nos que foi com “coração de pai” que José amou Jesus.
Humilde, discreto, trabalhador, sempre pronto a realizar a vontade de Deus,
homem do silêncio como escuta, atento aos sinais de Deus e aos sinais dos
tempos, corajoso, pedagogo e, sobretudo, justo. Em José confrontamo-nos com um
homem que é justo porque se ajustou a Deus. E é por se ajustar a Deus que cedo
aprendeu a pensar como Deus, a agir como Deus, a amar como Deus. A sua fé e a
alegria do seu amor foram o grande motor da sua vida. É também a alegria do
amor que o Papa Francisco nos convida a encontrar na família cristã quando
promove o Ano “Família Amoris Laetitia”. Ele insiste na leitura da Exortação
Apostólica Amoris Laetitia e deseja levar ao aprofundamento da identidade da
família cristã como dom de pessoas e como dom à Igreja e ao mundo. Deseja
promover o acompanhamento dos esposos, a educação integral dos filhos, a
reflexão sobre as luzes e sombras da vida da família cristã, as crises
familiares, a participação das famílias nas estruturas de evangelização e da
Igreja. Tempo de redescoberta e revitalização da nossa fé, a Quaresma deste ano
faz com que se cruzem a fé e a pandemia, a fé e a família, a fé e a gratidão
pelo dom da santidade de S. José.
De Jesus, na
sua Palavra, nos seus gestos, na vida da Igreja como Comunidade, brota uma
força que não deixa ninguém indiferente. Como discípulos de Jesus sempre em
processo de conversão, somos, pois, desafiados a viver mais uma Quaresma, mais
um dom que acontece ao longo da nossa existência. Se a mundaneidade convida ao
ter, ao parecer e ao poder, a Quaresma pede especial atenção ao ser. É um tempo
de penitência e conversão. Um tempo de oração filial que nos ajuda a limpar,
arrumar e romper a dureza do coração, convertendo-nos a Deus e aos irmãos. Uma
oração que leve ao jejum do pecado, à mudança menos boa de estar, pensar e
falar, à privação do que não é essencial, à penitência e austeridade pessoal,
ao sacrifício que liberta. Uma oração que converta e leve àquela partilha a que
chamamos “renúncia quaresmal” e que tem um destino determinado por cada Bispo
diocesano, tornado público no início da Quaresma e, ao longo da Quaresma,
entregue em cada paróquia. Não se trata de renunciar para poupar, não se trata
de um peditório, não se trata de uma recolha de fundos, não se trata de dar
para ficar arrumado e não me incomodarem mais, não se trata de pagar, não se
trata tanto de dar uma esmola a quem a pede ou necessita, embora não se deva
permanecer indiferente e fazer vista grossa. Trata-se duma caminhada espiritual
disciplinada e vivida na alegria da oração, da conversão interior, do pensar em
Deus e nos outros, do sentir a importância da gratuidade e da fraternidade.
Trata-se da mudança de mentalidade e de coração que também se pode traduzir em
renunciar a isto ou àquilo, que, embora se julgue apetecível, não é necessário,
e o seu custo se coloca de parte para a causa social anunciada. Para além
disso, a conversão pode mesmo implicar o aliviar dos bolsos (Lc 19, 1-10; Lc
18, 18-23). É uma pedagogia familiar de que tantas crianças e tantos jovens nos
dão tão belos testemunhos, renunciando a um bolo, a um cigarro, a um café, a um
programa televisivo, a ser escravo das redes socias... ou os leva a estudar
mais e melhor, a programar momentos de oração, a visitar o vizinho acamado ou a
viver mais comprometido nas causas da fé e do bem comum, a respeitar os apelos
ao confinamento e a vivê-lo com esperança, pensando na própria saúde e saúde
dos outros... Enfim, trata-se de cada um, pelos caminhos possíveis, viver a
Quaresma de tal forma que o conduza à Páscoa, descobrindo e redescobrindo cada
vez mais o gesto do amor de Deus para connosco manifestado em Cristo Jesus seu
Filho.
A Renúncia
Quaresmal de 2020, em toda a Diocese, e devido ao ambiente de confinamento
rigoroso, foi mesmo mesmo residual (1.769,34€). Tinha como destino ajudar à
construção de um Centro de Acolhimento e Saúde na Arquidiocese de Kananga,
República Democrática do Congo, donde temos dois sacerdotes a trabalhar nesta
nossa Diocese. Este ano de 2021, destinamos 60% para o mesmo fim e 40% para o
Fundo Social Diocesano, gerido pela Cáritas. De um Arciprestado, chegou à Cúria
Diocesana uma verba de renúncia quaresmal atrasada, a qual será enviada para o
destino anunciado nessa altura.
Antonino Dias
Portalegre-Castelo Branco, 12-02-2021.
Sem comentários:
Enviar um comentário