PARÓQUIA DE ALMODÔVAR
Quarta, 01 janeiro 2014
Esquema da página:
Liturgia do dia
Oração bíblica na base
das leituras da Missa do dia
Intenções do Apostolado
da Oração para o mês corrente
Atividades paroquiais
SANTA MARIA, MÃE DE DEUS
Quarta
Missa:
ANTÍFONA
DE ENTRADA Sedúlio
Salvé, Santa Mãe, que destes à luz o Rei do céu e da terra.
Ou cf. Is 9, 2.6; Lc 1,33
Hoje sobre nós resplandece uma luz: nasceu o Senhor.
O seu nome será admirável, Deus forte, Pai da eternidade,
Príncipe da paz. E o seu reino não terá fim.
Salvé, Santa Mãe, que destes à luz o Rei do céu e da terra.
Ou cf. Is 9, 2.6; Lc 1,33
Hoje sobre nós resplandece uma luz: nasceu o Senhor.
O seu nome será admirável, Deus forte, Pai da eternidade,
Príncipe da paz. E o seu reino não terá fim.
Diz-se o Glória.
ORAÇÃO COLECTA
Senhor nosso Deus,
que, pela virgindade fecunda de Maria Santíssima,
destes aos homens a salvação eterna,
fazei-nos sentir a intercessão daquela
que nos trouxe o Autor da vida, Jesus Cristo, vosso filho.
Ele que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
LEITURA I Num 6, 22-27
«Invocarão o meu nome sobre os filhos de Israel e Eu os abençoarei»
Leitura do Livro dos Números
O Senhor disse a Moisés: «Fala a Aarão e aos seus filhos e diz-lhes: Assim abençoareis os filhos de Israel, dizendo: ‘O Senhor te abençoe e te proteja. O Senhor faça brilhar sobre ti a sua face e te seja favorável. O Senhor volte para ti os seus olhos e te conceda a paz’. Assim invocarão o meu nome sobre os filhos de Israel e Eu os abençoarei».
Palavra do Senhor.
SALMO RESPONSORIAL Salmo 66 (67), 2-3.5.6 e 8 (R. 2a)
Refrão: Deus Se compadeça de nós
e nos dê a sua bênção. Repete-se
Deus Se compadeça de nós e nos dê a sua bênção,
resplandeça sobre nós a luz do seu rosto.
Na terra se conhecerão os seus caminhos
e entre os povos a sua salvação. Refrão
Alegrem-se e exultem as nações,
porque julgais os povos com justiça
e governais as nações sobre a terra. Refrão
Os povos Vos louvem, ó Deus,
todos os povos Vos louvem.
Deus nos dê a sua bênção
e chegue o seu temor aos confins da terra. Refrão
LEITURA II Gal 4, 4-7
«Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher»
Leitura da Epístola do apóstolo São Paulo aos Gálatas
Irmãos: Quando chegou a plenitude dos tempos, Deus enviou o seu Filho, nascido de uma mulher e sujeito à Lei, para resgatar os que estavam sujeitos à Lei e nos tornar seus filhos adotivos. E porque sois filhos, Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: «Abá! Pai!». Assim, já não és escravo, mas filho. E, se és filho, também és herdeiro, por graça de Deus.
Palavra do Senhor.
ALELUIA Hebr 1, 1-2
Refrão: Aleluia. Repete-se
Muitas vezes e de muitos modos
falou Deus antigamente aos nossos pais pelos Profetas.
Nestes dias, que são os últimos,
Deus falou-nos por seu Filho. Refrão
EVANGELHO Lc 2, 16-21
«Encontraram Maria, José e o Menino.
Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
Naquele tempo, os pastores dirigiram-se apressadamente para Belém e encontraram Maria, José e o Menino deitado na manjedoura. Quando O viram, começaram a contar o que lhes tinham anunciado sobre aquele Menino. E todos os que ouviam admiravam-se do que os pastores diziam. Maria conservava todos estes acontecimentos, meditando-os em seu coração. Os pastores regressaram, glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, como lhes tinha sido anunciado. Quando se completaram os oito dias para o Menino ser circuncidado, deram-Lhe o nome de Jesus, indicado pelo Anjo, antes de ter sido concebido no seio materno.
Palavra da salvação.
Diz-se o Credo.
ORAÇÃO SOBRE AS OBLATAS
Senhor nosso Deus,
que dais origem a todos os bens
e os levais à sua plenitude,
nós vos pedimos,
nesta solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus:
Assim como celebramos festivamente as primícias da vossa graça,
tenhamos também a alegria de receber os seus frutos.
Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso filho,
que é Deus convosco na unidade do Espírito Santo.
Prefácio de Nossa Senhora I [na maternidade]
No Cânone Romano diz-se o communicantes (Em comunhão com toda a Igreja) próprio. Nas Orações Eucarísticas II e III faz-se também a comemoração própria do Natal
ANTÍFONA
DA COMUNHÃO Hebr 13, 8
Jesus Cristo, ontem e hoje e por toda a eternidade.
ORAÇÃO DEPOIS DA COMUNHÃO
Senhor nosso Deus,
recebemos com alegria os vossos sacramentos
nesta solenidade em que proclamamos
a Virgem Santa Maria, Mãe do vosso Filho e Mãe da Igreja:
fazei que esta comunhão nos ajude a crescer para a vida eterna.
Por Nosso Senhor.
Jesus Cristo, ontem e hoje e por toda a eternidade.
ORAÇÃO DEPOIS DA COMUNHÃO
Senhor nosso Deus,
recebemos com alegria os vossos sacramentos
nesta solenidade em que proclamamos
a Virgem Santa Maria, Mãe do vosso Filho e Mãe da Igreja:
fazei que esta comunhão nos ajude a crescer para a vida eterna.
Por Nosso Senhor.
Liturgia
das horas
Das Cartas de Santo Atanásio, bispo
Epist. ad Epictetum, 5-9: PG 26, 1058. 1062-1066) (Sec. IV)
O Verbo tomou de Maria a nossa condição humana
Epist. ad Epictetum, 5-9: PG 26, 1058. 1062-1066) (Sec. IV)
O Verbo tomou de Maria a nossa condição humana
O Verbo de Deus
veio para socorrer a descendência de Abraão, como afirma o Apóstolo, e por isso
devia tornar-Se semelhante em tudo aos seus irmãos e assumir um corpo
semelhante ao nosso. É para isso que Maria está verdadeiramente presente neste
mistério; foi d’Ela que o Verbo assumiu como próprio aquele corpo que havia de
oferecer por nós. A Sagrada Escritura recorda este nascimento e diz: Envolveu-O
em panos; além disso, proclama ditosos os peitos que amamentaram o Senhor e
fala também do sacrifício oferecido pelo nascimento deste Primogénito. O anjo
Gabriel tinha anunciado esta conceção com toda a precisão e prudência; não lhe
disse: «O que há-de nascer em ti», como se tratasse de algo extrínseco, mas de
ti, para indicar que o fruto deste nascimento procedia realmente de Maria.
O Verbo, ao tomar a nossa condição humana e ao oferecê-la em sacrifício, assumiu-a na sua totalidade, para nos revestir depois a nós da sua condição divina, segundo as palavras do Apóstolo: É preciso que este corpo corruptível se revista de incorruptibilidade e que este corpo mortal se revista de imortalidade.
O Verbo, ao tomar a nossa condição humana e ao oferecê-la em sacrifício, assumiu-a na sua totalidade, para nos revestir depois a nós da sua condição divina, segundo as palavras do Apóstolo: É preciso que este corpo corruptível se revista de incorruptibilidade e que este corpo mortal se revista de imortalidade.
Estas coisas não se realizaram de maneira fictícia, como disseram alguns. Longe de nós tal pensamento! O nosso Salvador foi verdadeiramente homem e assim alcançou a salvação do homem na sua totalidade. Não se trata de uma salvação fictícia, nem se limita a salvar o corpo: o Verbo de Deus realizou a salvação do homem todo, isto é, do corpo e da alma.
Portanto, era verdadeiramente humana a natureza do que nasceu de Maria, segundo as divinas escrituras; era verdadeiramente humano o corpo do Senhor. Verdadeiramente humano, quero dizer, um corpo igual ao nosso. Maria é, de facto, nossa irmã, porque todos descendemos de Adão.
O que João afirma ao dizer: O Verbo Se fez homem, tem um significado semelhante ao que se encontra numa expressão paralela de São Paulo quando diz: Cristo fez-Se maldição por nós. Pela união e comunhão com o Verbo, o corpo humano recebeu um enriquecimento admirável: era mortal e passou a ser imortal, era animal e converteu-se em espiritual, era terreno e transpôs as portas do Céu.
Por outro lado, a Trindade, mesmo depois da encarnação do Verbo em Maria, continua a ser a mesma Trindade, sem aumento nem diminuição, permanecendo sempre na sua perfeição absoluta. E assim se proclama na Igreja: a Trindade numa única divindade; um só Deus, no Pai e no Verbo.
.
«Deus
ama de tal modo a humanidade que lhe dá o próprio Filho».
MÉTODO DE ORAÇÃO BÍBLICA
1.
Leitura: Lê, respeita, situa o que lês
- Detém-te no
conteúdo de fé e da passagem que leste
2.
Meditação: Interioriza, dialoga, atualiza o que leste
- Deixa que a
passagem da Palavra de Deus que leste “leia a tua vida”
3.
Oração: Louva o Senhor, suplica, escuta
- Dirige-te a Deus que te falou através
da Sua Palavra
LEITURA: - Num 6, 22-27 : Recitada sobre o povo, que se havia reunido para o sacrifício da
manhã, esta bênção sacerdotal é um augúrio de paz para os filhos de Israel.
Esta «paz», que em si concentra todos os bens, é um dom de Deus. Invadiu o
mundo com o Nascimento de Jesus, pois o Salvador, realizando em Si as promessas
divinas de salvação, reconciliou-nos com o Pai e estabeleceu relações
fraternais entre os homens. Mas esta Paz, que se fundamenta na Paternidade
divina, é também uma conquista do homem. Na verdade, a paz, antes de ser uma
realidade externa, é uma disposição interior. «Se antes não se travassem
guerras em milhões de corações, também se não travariam no campo de batalha».
Cada um de nós deve ser, pois, construtor da paz verdadeira.
Gal 4, 4-7 : O Mistério da Incarnação realiza-se na plenitude dos tempos, no termo duma longa expectativa da humanidade, numa maravilhosa manifestação da benevolência divina. Em Cristo, com efeito, Deus cumula os homens de todas as bênçãos, concedendo-lhes a filiação divina e libertando-os da escravidão da lei mosaica.
Para produzir, porém, este duplo efeito, a Encarnação realiza-se pela via normal dos homens e da lei. Cristo aceita um nascimento humano e a submissão à lei. A lei situa-O na História da Salvação, na História do Seu Povo; Maria situa-O entre os homens, Seus irmãos, que vem libertar e salvar, tornando-os, à Sua semelhança, filhos do Pai.
Maria assume assim um papel insubstituível
nesta revelação da Paternidade divina. É a Mãe de Deus, que concebe Seu Filho
por obra e graça do Espírito Santo. É a Mãe da Igreja, Corpo de Cristo na
terra.
Lc 2, 16-21:
De todos aqueles que virão a ser adotados em Cristo como filhos de Deus,
os pastores são os primeiros a receberem a Boa Notícia da Salvação. É, porém,
junto de Maria, Sua Mãe, a primeira crente, a totalmente disponível a Deus, que
encontram o Salvador e, n’Ele, se encontram com Deus. A intervenção discreta de
Maria ajudou-os, na verdade, a descobrir o verdadeiro rosto de Seu Filho.
«A Virgem Santíssima, predestinada para Mãe de Deus desde toda a eternidade, simultaneamente com a Encarnação do Verbo, por disposição da divina providência foi na terra a nobre Mãe do divino Redentor, a Sua mais generosa cooperadora e a escrava humilde do Senhor – Cooperou de modo singular, com a sua fé, esperança e ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural. É por esta razão nossa Mãe na ordem da graça» (LG., 61).
«A Virgem Santíssima, predestinada para Mãe de Deus desde toda a eternidade, simultaneamente com a Encarnação do Verbo, por disposição da divina providência foi na terra a nobre Mãe do divino Redentor, a Sua mais generosa cooperadora e a escrava humilde do Senhor – Cooperou de modo singular, com a sua fé, esperança e ardente caridade, na obra do Salvador, para restaurar nas almas a vida sobrenatural. É por esta razão nossa Mãe na ordem da graça» (LG., 61).
ATIVIDADES
PAROQUIAIS
10.30
horas: - Missa em Almodôvar
12.00
horas: - Missa em Santa Clara
16.30
horas: - Missa em Gomes Aires
INTENÇÕES DO SANTO PADRE
Janeiro 2014
Universal
– Desenvolvimento
económico
Para que seja promovido um autêntico desenvolvimento económico, respeitoso da dignidade de todas as pessoas e de todos os povos.
Para que seja promovido um autêntico desenvolvimento económico, respeitoso da dignidade de todas as pessoas e de todos os povos.
Pela
Evangelização – Unidade
dos cristãos
Para que os cristãos das diversas confissões caminhem em direção à unidade desejada por Cristo.
Para que os cristãos das diversas confissões caminhem em direção à unidade desejada por Cristo.
PARA TODOS:
UM ABENÇOADO ANO DE 2014
____________________________________________________
MENSAGEM DO SANTO PADRE
FRANCISCO
PARA A CELEBRAÇÃO DO
XLVII DIA MUNDIAL DA PAZ
FRANCISCO
PARA A CELEBRAÇÃO DO
XLVII DIA MUNDIAL DA PAZ
1º DE JANEIRO DE 2014
FRATERNIDADE, FUNDAMENTO E CAMINHO PARA A PAZ
1. Nesta minha primeira
Mensagem para o Dia Mundial da Paz, desejo formular a todos, indivíduos e
povos, votos duma vida repleta de alegria e esperança. Com efeito, no coração
de cada homem e mulher, habita o anseio duma vida plena que contém uma
aspiração irreprimível de fraternidade, impelindo à comunhão com os outros, em
quem não encontramos inimigos ou concorrentes, mas irmãos que devemos acolher e
abraçar.
Na realidade, a
fraternidade é uma dimensão essencial do homem, sendo ele um ser relacional. A
consciência viva desta dimensão relacional leva-nos a ver e tratar cada pessoa
como uma verdadeira irmã e um verdadeiro irmão; sem tal consciência, torna-se
impossível a construção duma sociedade justa, duma paz firme e duradoura. E
convém desde já lembrar que a fraternidade se começa a aprender habitualmente
no seio da família, graças sobretudo às funções responsáveis e complementares
de todos os seus membros, mormente do pai e da mãe. A família é a fonte de toda
a fraternidade, sendo por isso mesmo também o fundamento e o caminho primário
para a paz, já que, por vocação, deveria contagiar o mundo com o seu amor.
O número sempre
crescente de ligações e comunicações que envolvem o nosso planeta torna mais
palpável a consciência da unidade e partilha dum destino comum entre as nações
da terra. Assim, nos dinamismos da história – independentemente da diversidade
das etnias, das sociedades e das culturas –, vemos semeada a vocação a formar
uma comunidade feita de irmãos que se acolhem mutuamente e cuidam uns dos outros.
Contudo, ainda hoje, esta vocação é muitas vezes contrastada e negada nos
factos, num mundo caracterizado pela «globalização da indiferença» que
lentamente nos faz «habituar» ao sofrimento alheio, fechando-nos em nós mesmos.
Em muitas partes do
mundo, parece não conhecer tréguas a grave lesão dos direitos humanos
fundamentais, sobretudo dos direitos à vida e à liberdade de religião. Exemplo
preocupante disso mesmo é o dramático fenómeno do tráfico de seres humanos,
sobre cuja vida e desespero especulam pessoas sem escrúpulos. Às guerras feitas
de confrontos armados juntam-se guerras menos visíveis, mas não menos cruéis,
que se combatem nos campos económico e financeiro com meios igualmente
demolidores de vidas, de famílias, de empresas.
A globalização, como
afirmou Bento XVI, torna-nos vizinhos, mas não nos faz
irmãos.[1]
As inúmeras situações de desigualdade, pobreza e injustiça indicam não só uma
profunda carência de fraternidade, mas também a ausência duma cultura de
solidariedade. As novas ideologias, caracterizadas por generalizado
individualismo, egocentrismo e consumismo materialista, debilitam os laços
sociais, alimentando aquela mentalidade do «descartável» que induz ao desprezo
e abandono dos mais fracos, daqueles que são considerados «inúteis». Assim, a
convivência humana assemelha-se sempre mais a um mero do ut des
pragmático e egoísta.
Ao mesmo tempo, resulta
claramente que as próprias éticas contemporâneas se mostram incapazes de
produzir autênticos vínculos de fraternidade, porque uma fraternidade privada
da referência a um Pai comum como seu fundamento último não consegue subsistir.[2]
Uma verdadeira fraternidade entre os homens supõe e exige uma paternidade
transcendente. A partir do reconhecimento desta paternidade, consolida-se a
fraternidade entre os homens, ou seja, aquele fazer-se «próximo» para cuidar do
outro.
«Onde
está o teu irmão?» (Gn 4, 9)
2. Para compreender
melhor esta vocação do homem à fraternidade e para reconhecer de forma mais
adequada os obstáculos que se interpõem à sua realização e identificar as vias
para a superação dos mesmos, é fundamental deixar-se guiar pelo conhecimento do
desígnio de Deus, tal como se apresenta de forma egrégia na Sagrada Escritura.
Segundo a narração das
origens, todos os homens provêm dos mesmos pais, de Adão e Eva, casal criado
por Deus à sua imagem e semelhança (cf. Gn 1, 26), do qual nascem Caim e
Abel. Na história desta família primigénia, lemos a origem da sociedade, a
evolução das relações entre as pessoas e os povos.
Abel é pastor, Caim
agricultor. A sua identidade profunda e, conjuntamente, a sua vocação é ser
irmãos, embora na diversidade da sua actividade e cultura, da sua maneira
de se relacionarem com Deus e com a criação. Mas o assassinato de Abel por Caim
atesta, tragicamente, a rejeição radical da vocação a ser irmãos. A sua
história (cf. Gn 4, 1-16) põe em evidência o difícil dever, a que todos
os homens são chamados, de viver juntos, cuidando uns dos outros. Caim, não
aceitando a predilecção de Deus por Abel, que Lhe oferecia o melhor do seu
rebanho – «o Senhor olhou com agrado para Abel e para a sua oferta, mas não
olhou com agrado para Caim nem para a sua oferta» (Gn 4, 4-5) –, mata
Abel por inveja. Desta forma, recusa reconhecer-se irmão, relacionar-se
positivamente com ele, viver diante de Deus, assumindo as suas
responsabilidades de cuidar e proteger o outro. À pergunta com que Deus
interpela Caim – «onde está o teu irmão?» –, pedindo-lhe contas da sua acção,
responde: «Não sei dele. Sou, porventura, guarda do meu irmão?» (Gn 4,
9). Depois – diz-nos o livro do Génesis –, «Caim afastou-se da presença do
Senhor» (4, 16).
É preciso interrogar-se
sobre os motivos profundos que induziram Caim a ignorar o vínculo de
fraternidade e, simultaneamente, o vínculo de reciprocidade e comunhão que o
ligavam ao seu irmão Abel. O próprio Deus denuncia e censura a Caim a sua
contiguidade com o mal: «o pecado deitar-se-á à tua porta» (Gn 4, 7).
Mas Caim recusa opor-se ao mal, e decide igualmente «lançar-se sobre o irmão» (Gn
4, 8), desprezando o projecto de Deus. Deste modo, frustra a sua vocação
original para ser filho de Deus e viver a fraternidade.
A narração de Caim e
Abel ensina que a humanidade traz inscrita em si mesma uma vocação à
fraternidade, mas também a possibilidade dramática da sua traição. Disso mesmo
dá testemunho o egoísmo diário, que está na base de muitas guerras e
injustiças: na realidade, muitos homens e mulheres morrem pela mão de irmãos e
irmãs que não sabem reconhecer-se como tais, isto é, como seres feitos para a
reciprocidade, a comunhão e a doação.
«E
vós sois todos irmãos» (Mt
23, 8)
3. Surge espontaneamente
a pergunta: poderão um dia os homens e as mulheres deste mundo corresponder
plenamente ao anseio de fraternidade, gravado neles por Deus Pai? Conseguirão,
meramente com as suas forças, vencer a indiferença, o egoísmo e o ódio, aceitar
as legítimas diferenças que caracterizam os irmãos e as irmãs?
Parafraseando as
palavras do Senhor Jesus, poderemos sintetizar assim a resposta que Ele nos dá:
dado que há um só Pai, que é Deus, vós sois todos irmãos (cf. Mt 23,
8-9). A raiz da fraternidade está contida na paternidade de Deus. Não se trata
de uma paternidade genérica, indistinta e historicamente ineficaz, mas do amor
pessoal, solícito e extraordinariamente concreto de Deus por cada um dos homens
(cf. Mt 6, 25-30). Trata-se, por conseguinte, de uma paternidade
eficazmente geradora de fraternidade, porque o amor de Deus, quando é acolhido,
torna-se no mais admirável agente de transformação da vida e das relações com o
outro, abrindo os seres humanos à solidariedade e à partilha activa.
Em particular, a
fraternidade humana foi regenerada em e por Jesus Cristo, com a
sua morte e ressurreição. A cruz é o «lugar» definitivo de fundação da
fraternidade que os homens, por si sós, não são capazes de gerar. Jesus Cristo,
que assumiu a natureza humana para a redimir, amando o Pai até à morte e morte
de cruz (cf. Fl 2, 8), por meio da sua ressurreição constitui-nos como humanidade
nova, em plena comunhão com a vontade de Deus, com o seu projecto, que
inclui a realização plena da vocação à fraternidade.
Jesus retoma o projecto
inicial do Pai, reconhecendo-Lhe a primazia sobre todas as coisas. Mas Cristo,
com o seu abandono até à morte por amor do Pai, torna-Se princípio novo
e definitivo de todos nós, chamados a reconhecer-nos n’Ele como irmãos,
porque filhos do mesmo Pai. Ele é a própria Aliança, o espaço pessoal da
reconciliação do homem com Deus e dos irmãos entre si. Na morte de Jesus na
cruz, ficou superada também a separação entre os povos, entre o povo da
Aliança e o povo dos Gentios, privado de esperança porque permanecera até então
alheio aos pactos da Promessa. Como se lê na Carta aos Efésios, Jesus Cristo é
Aquele que reconcilia em Si todos os homens. Ele é a paz, porque, dos
dois povos, fez um só, derrubando o muro de separação que os dividia, ou seja,
a inimizade. Criou em Si mesmo um só povo, um só homem novo, uma só humanidade
nova (cf. 2,14-16).
Quem aceita a vida de
Cristo e vive n’Ele, reconhece Deus como Pai e a Ele Se entrega totalmente,
amando-O acima de todas as coisas. O homem reconciliado vê, em Deus, o Pai de
todos e, consequentemente, é solicitado a viver uma fraternidade aberta a
todos. Em Cristo, o outro é acolhido e amado como filho ou filha de Deus, como
irmão ou irmã, e não como um estranho, menos ainda como um antagonista ou até
um inimigo. Na família de Deus, onde todos são filhos dum mesmo Pai e, porque
enxertados em Cristo, filhos no Filho, não há «vidas descartáveis».
Todos gozam de igual e inviolável dignidade; todos são amados por Deus, todos foram
resgatados pelo sangue de Cristo, que morreu na cruz e ressuscitou por cada um.
Esta é a razão pela qual não se pode ficar indiferente perante a sorte dos
irmãos.
A
fraternidade, fundamento e caminho para a paz
4. Suposto isto, é fácil
compreender que a fraternidade é fundamento e caminho para a paz.
As Encíclicas sociais dos meus Predecessores oferecem uma ajuda valiosa neste
sentido. Basta ver as definições de paz da Populorum progressio, de Paulo VI, ou da Sollicitudo rei socialis, de João Paulo II. Da primeira, apreendemos que o
desenvolvimento integral dos povos é o novo nome da paz[3]
e, da segunda, que a paz é opus solidaritatis, fruto da solidariedade.[4]
Paulo VI afirma que
tanto as pessoas como as nações se devem encontrar num espírito de
fraternidade. E explica: «Nesta compreensão e amizade mútuas, nesta comunhão
sagrada, devemos (...) trabalhar juntos para construir o futuro comum da
humanidade».[5]
Este dever recai primariamente sobre os mais favorecidos. As suas obrigações
radicam-se na fraternidade humana e sobrenatural, apresentando-se sob um tríplice
aspecto: o dever de solidariedade, que exige que as nações ricas ajudem
as menos avançadas; o dever de justiça social, que requer a reformulação
em termos mais correctos das relações defeituosas entre povos fortes e povos
fracos; o dever de caridade universal, que implica a promoção de um
mundo mais humano para todos, um mundo onde todos tenham qualquer coisa a dar e
a receber, sem que o progresso de uns seja obstáculo ao desenvolvimento dos
outros.[6]
Ora, da mesma forma que
se considera a paz como opus solidarietatis, é impossível não pensar que
o seu fundamento principal seja a fraternidade. A paz, afirma João Paulo II, é um bem indivisível: ou é bem
de todos, ou não o é de ninguém. Na realidade, a paz só pode ser conquistada e
usufruída como melhor qualidade de vida e como desenvolvimento mais humano e
sustentável, se estiver viva, em todos, «a determinação firme e perseverante de
se empenhar pelo bem comum».[7]
Isto implica não deixar-se guiar pela «avidez do lucro» e pela «sede do poder».
É preciso estar pronto a «“perder-se” em benefício do próximo em vez de o
explorar, e a “servi-lo” em vez de o oprimir para proveito próprio (...). O
“outro” – pessoa, povo ou nação – [não deve ser visto] como um instrumento
qualquer, de que se explora, a baixo preço, a capacidade de trabalhar e a
resistência física, para o abandonar quando já não serve; mas sim como um nosso
“semelhante”, um “auxílio”».[8]
A solidariedade
cristã pressupõe que o próximo seja amado não só como «um ser humano com os
seus direitos e a sua igualdade fundamental em relação a todos os demais, mas
[como] a imagem viva de Deus Pai, resgatada pelo sangue de Jesus Cristo
e tornada objecto da acção permanente do Espírito Santo»,[9]
como um irmão. «Então a consciência da paternidade comum de Deus, da
fraternidade de todos os homens em Cristo, “filhos no Filho”, e da presença e
da acção vivificante do Espírito Santo conferirá – lembra João Paulo II – ao nosso olhar sobre o mundo
como que um novo critério para o interpretar»,[10]
para o transformar.
A
fraternidade, premissa para vencer a pobreza
5. Na Caritas in veritate, o meu Predecessor lembrava ao mundo que uma causa
importante da pobreza é a falta de fraternidade entre os povos e
entre os homens.[11]
Em muitas sociedades, sentimos uma profunda pobreza relacional, devido à
carência de sólidas relações familiares e comunitárias; assistimos, preocupados,
ao crescimento de diferentes tipos de carências, marginalização, solidão e de
várias formas de dependência patológica. Uma tal pobreza só pode ser superada
através da redescoberta e valorização de relações fraternas no seio das
famílias e das comunidades, através da partilha das alegrias e tristezas, das
dificuldades e sucessos presentes na vida das pessoas.
Além disso, se por um
lado se verifica uma redução da pobreza absoluta, por outro não podemos
deixar de reconhecer um grave aumento da pobreza relativa, isto é, de
desigualdades entre pessoas e grupos que convivem numa região específica ou num
determinado contexto histórico-cultural. Neste sentido, servem políticas
eficazes que promovam o princípio da fraternidade, garantindo às pessoas
– iguais na sua dignidade e nos seus direitos fundamentais – acesso aos
«capitais», aos serviços, aos recursos educativos, sanitários e tecnológicos,
para que cada uma delas tenha oportunidade de exprimir e realizar o seu
projecto de vida e possa desenvolver-se plenamente como pessoa.
Reconhece-se haver
necessidade também de políticas que sirvam para atenuar a excessiva
desigualdade de rendimento. Não devemos esquecer o ensinamento da Igreja sobre
a chamada hipoteca social, segundo a qual, se é lícito – como diz São
Tomás de Aquino – e mesmo necessário que «o homem tenha a propriedade dos
bens»,[12]
quanto ao uso, porém, «não deve considerar as coisas exteriores que
legitimamente possui só como próprias, mas também como comuns, no sentido de
que possam beneficiar não só a si mas também aos outros».[13]
Por último, há uma forma
de promover a fraternidade – e, assim, vencer a pobreza – que deve estar na
base de todas as outras. É o desapego vivido por quem escolhe estilos de vida
sóbrios e essenciais, por quem, partilhando as suas riquezas, consegue assim
experimentar a comunhão fraterna com os outros. Isto é fundamental, para seguir
Jesus Cristo e ser verdadeiramente cristão. É o caso não só das pessoas
consagradas que professam voto de pobreza, mas também de muitas famílias e
tantos cidadãos responsáveis que acreditam firmemente que a relação fraterna
com o próximo constitua o bem mais precioso.
A
redescoberta da fraternidade na economia
6. As graves crises
financeiras e económicas dos nossos dias – que têm a sua origem no progressivo
afastamento do homem de Deus e do próximo, com a ambição desmedida de bens
materiais, por um lado, e o empobrecimento das relações interpessoais e
comunitárias, por outro – impeliram muitas pessoas a buscar o bem-estar, a
felicidade e a segurança no consumo e no lucro fora de toda a lógica duma
economia saudável. Já, em 1979, o Papa João Paulo II alertava para a existência
de «um real e perceptível perigo de que, enquanto progride enormemente o
domínio do homem sobre o mundo das coisas, ele perca os fios essenciais deste
seu domínio e, de diversas maneiras, submeta a elas a sua humanidade, e ele
próprio se torne objecto de multiforme manipulação, se bem que muitas vezes não
directamente perceptível; manipulação através de toda a organização da vida
comunitária, mediante o sistema de produção e por meio de pressões dos meios de
comunicação social».[14]
As sucessivas crises
económicas devem levar a repensar adequadamente os modelos de desenvolvimento
económico e a mudar os estilos de vida. A crise actual, com pesadas
consequências na vida das pessoas, pode ser também uma ocasião propícia para
recuperar as virtudes da prudência, temperança, justiça e fortaleza. Elas podem
ajudar-nos a superar os momentos difíceis e a redescobrir os laços fraternos
que nos unem uns aos outros, com a confiança profunda de que o homem tem
necessidade e é capaz de algo mais do que a maximização do próprio lucro
individual. As referidas virtudes são necessárias sobretudo para construir e
manter uma sociedade à medida da dignidade humana.
A
fraternidade extingue a guerra
7. Ao longo do ano que
termina, muitos irmãos e irmãs nossos continuaram a viver a experiência
dilacerante da guerra, que constitui uma grave e profunda ferida infligida à
fraternidade.
Há muitos conflitos que
se consumam na indiferença geral. A todos aqueles que vivem em terras onde as
armas impõem terror e destruição, asseguro a minha solidariedade pessoal e a de
toda a Igreja. Esta última tem por missão levar o amor de Cristo também às
vítimas indefesas das guerras esquecidas, através da oração pela paz, do
serviço aos feridos, aos famintos, aos refugiados, aos deslocados e a quantos
vivem no terror. De igual modo a Igreja levanta a sua voz para fazer chegar aos
responsáveis o grito de dor desta humanidade atribulada e fazer cessar,
juntamente com as hostilidades, todo o abuso e violação dos direitos fundamentais
do homem.[15]
Por este motivo, desejo
dirigir um forte apelo a quantos semeiam violência e morte, com as armas:
naquele que hoje considerais apenas um inimigo a abater, redescobri o vosso
irmão e detende a vossa mão! Renunciai à via das armas e ide ao encontro do
outro com o diálogo, o perdão e a reconciliação para reconstruir a justiça, a
confiança e esperança ao vosso redor! «Nesta óptica, torna-se claro que, na
vida dos povos, os conflitos armados constituem sempre a deliberada negação de
qualquer concórdia internacional possível, originando divisões profundas e
dilacerantes feridas que necessitam de muitos anos para se curarem. As guerras
constituem a rejeição prática de se comprometer para alcançar aquelas grandes
metas económicas e sociais que a comunidade internacional estabeleceu».[16]
Mas, enquanto houver em
circulação uma quantidade tão grande como a actual de armamentos, poder-se-á
sempre encontrar novos pretextos para iniciar as hostilidades. Por isso, faço
meu o apelo lançado pelos meus Predecessores a favor da não-proliferação das
armas e do desarmamento por parte de todos, a começar pelo desarmamento nuclear
e químico.
Não podemos, porém, deixar
de constatar que os acordos internacionais e as leis nacionais, embora sendo
necessários e altamente desejáveis, por si sós não bastam para preservar a
humanidade do risco de conflitos armados. É precisa uma conversão do coração
que permita a cada um reconhecer no outro um irmão do qual cuidar e com o qual
trabalhar para, juntos, construírem uma vida em plenitude para todos. Este é o
espírito que anima muitas das iniciativas da sociedade civil, incluindo as
organizações religiosas, a favor da paz. Espero que o compromisso diário de
todos continue a dar fruto e que se possa chegar também à efectiva aplicação,
no direito internacional, do direito à paz como direito humano fundamental,
pressuposto necessário para o exercício de todos os outros direitos.
A
corrupção e o crime organizado contrastam a fraternidade
8. O horizonte da
fraternidade apela ao crescimento em plenitude de todo o homem e mulher. As
justas ambições duma pessoa, sobretudo se jovem, não devem ser frustradas nem
lesadas; não se lhe deve roubar a esperança de podê-las realizar. A ambição,
porém, não deve ser confundida com prevaricação; pelo contrário, é necessário
competir na mútua estima (cf. Rm 12, 10). Mesmo nas disputas, que
constituem um aspecto inevitável da vida, é preciso recordar-se sempre de que
somos irmãos; por isso, é necessário educar e educar-se para não considerar o
próximo como um inimigo nem um adversário a eliminar.
A fraternidade gera paz
social, porque cria um equilíbrio entre liberdade e justiça, entre
responsabilidade pessoal e solidariedade, entre bem dos indivíduos e bem comum.
Uma comunidade política deve, portanto, agir de forma transparente e
responsável para favorecer tudo isto. Os cidadãos devem sentir-se representados
pelos poderes públicos, no respeito da sua liberdade. Em vez disso, muitas
vezes, entre cidadão e instituições, interpõem-se interesses partidários que
deformam essa relação, favorecendo a criação dum clima perene de conflito.
Um autêntico espírito de
fraternidade vence o egoísmo individual, que contrasta a possibilidade das
pessoas viverem em liberdade e harmonia entre si. Tal egoísmo desenvolve-se,
socialmente, quer nas muitas formas de corrupção que hoje se difunde de maneira
capilar, quer na formação de organizações criminosas – desde os pequenos grupos
até àqueles organizados à escala global – que, minando profundamente a
legalidade e a justiça, ferem no coração a dignidade da pessoa. Estas
organizações ofendem gravemente a Deus, prejudicam os irmãos e lesam a criação,
revestindo-se duma gravidade ainda maior se têm conotações religiosas.
Penso no drama
dilacerante da droga com a qual se lucra desafiando leis morais e civis, na
devastação dos recursos naturais e na poluição em curso, na tragédia da
exploração do trabalho; penso nos tráficos ilícitos de dinheiro como também na
especulação financeira que, muitas vezes, assume caracteres predadores e
nocivos para inteiros sistemas económicos e sociais, lançando na pobreza
milhões de homens e mulheres; penso na prostituição que diariamente ceifa
vítimas inocentes, sobretudo entre os mais jovens, roubando-lhes o futuro;
penso no abomínio do tráfico de seres humanos, nos crimes e abusos contra
menores, na escravidão que ainda espalha o seu horror em muitas partes do
mundo, na tragédia frequentemente ignorada dos emigrantes sobre quem se
especula indignamente na ilegalidade. A este respeito escreveu João XXIII: «Uma convivência baseada
unicamente em relações de força nada tem de humano: nela vêem as pessoas
coarctada a própria liberdade, quando, pelo contrário, deveriam ser postas em
condição tal que se sentissem estimuladas a procurar o próprio desenvolvimento
e aperfeiçoamento».[17]
Mas o homem pode converter-se, e não se deve jamais desesperar da possibilidade
de mudar de vida. Gostaria que isto fosse uma mensagem de confiança para todos,
mesmo para aqueles que cometeram crimes hediondos, porque Deus não quer a morte
do pecador, mas que se converta e viva (cf. Ez 18, 23).
No contexto alargado da
sociabilidade humana, considerando o delito e a pena, penso também nas
condições desumanas de muitos estabelecimentos prisionais, onde frequentemente
o preso acaba reduzido a um estado sub-humano, violado na sua dignidade de
homem e sufocado também em toda a vontade e expressão de resgate. A Igreja faz
muito em todas estas áreas, a maior parte das vezes sem rumor. Exorto e
encorajo a fazer ainda mais, na esperança de que tais acções desencadeadas por
tantos homens e mulheres corajosos possam cada vez mais ser sustentadas, leal e
honestamente, também pelos poderes civis.
A
fraternidade ajuda a guardar e cultivar a natureza
9. A família humana
recebeu, do Criador, um dom em comum: a natureza. A visão cristã da criação
apresenta um juízo positivo sobre a licitude das intervenções na natureza para
dela tirar benefício, contanto que se actue responsavelmente, isto é,
reconhecendo aquela «gramática» que está inscrita nela e utilizando, com
sabedoria, os recursos para proveito de todos, respeitando a beleza, a
finalidade e a utilidade dos diferentes seres vivos e a sua função no
ecossistema. Em suma, a natureza está à nossa disposição, mas somos chamados a
administrá-la responsavelmente. Em vez disso, muitas vezes deixamo-nos guiar
pela ganância, pela soberba de dominar, possuir, manipular, desfrutar; não
guardamos a natureza, não a respeitamos, nem a consideramos como um dom
gratuito de que devemos cuidar e colocar ao serviço dos irmãos, incluindo as
gerações futuras.
De modo particular o
sector produtivo primário, o sector agrícola, tem a vocação vital de
cultivar e guardar os recursos naturais para alimentar a humanidade. A
propósito, a persistente vergonha da fome no mundo leva-me a partilhar convosco
esta pergunta: De que modo usamos os recursos da terra? As sociedades
actuais devem reflectir sobre a hierarquia das prioridades no destino da
produção. De facto, é um dever impelente que se utilizem de tal modo os
recursos da terra, que todos se vejam livres da fome. As iniciativas e as
soluções possíveis são muitas, e não se limitam ao aumento da produção. É mais
que sabido que a produção actual é suficiente, e todavia há milhões de pessoas
que sofrem e morrem de fome, o que constitui um verdadeiro escândalo. Por isso,
é necessário encontrar o modo para que todos possam beneficiar dos frutos da
terra, não só para evitar que se alargue o fosso entre aqueles que têm mais e
os que devem contentar-se com as migalhas, mas também e sobretudo por uma
exigência de justiça e equidade e de respeito por cada ser humano. Neste
sentido, gostaria de lembrar a todos o necessário destino universal dos bens,
que é um dos princípios fulcrais da doutrina social da Igreja. O respeito deste
princípio é a condição essencial para permitir um acesso real e equitativo aos
bens essenciais e primários de que todo o homem precisa e tem direito.
Conclusão
10. Há necessidade que a
fraternidade seja descoberta, amada, experimentada, anunciada e testemunhada;
mas só o amor dado por Deus é que nos permite acolher e viver plenamente a
fraternidade.
O necessário realismo da
política e da economia não pode reduzir-se a um tecnicismo sem ideal, que
ignora a dimensão transcendente do homem. Quando falta esta abertura a Deus,
toda a actividade humana se torna mais pobre, e as pessoas são reduzidas a
objecto passível de exploração. Somente se a política e a economia aceitarem
mover-se no amplo espaço assegurado por esta abertura Àquele que ama todo o
homem e mulher, é que conseguirão estruturar-se com base num verdadeiro
espírito de caridade fraterna e poderão ser instrumento eficaz de
desenvolvimento humano integral e de paz.
Nós, cristãos,
acreditamos que, na Igreja, somos membros uns dos outros e todos mutuamente
necessários, porque a cada um de nós foi dada uma graça, segundo a medida do
dom de Cristo, para utilidade comum (cf. Ef 4, 7.25; 1 Cor 12,
7). Cristo veio ao mundo para nos trazer a graça divina, isto é, a
possibilidade de participar na sua vida. Isto implica tecer um relacionamento
fraterno, caracterizado pela reciprocidade, o perdão, o dom total de si mesmo,
segundo a grandeza e a profundidade do amor de Deus, oferecido à humanidade por
Aquele que, crucificado e ressuscitado, atrai todos a Si: «Dou-vos um novo
mandamento: que vos ameis uns aos outros; que vos ameis uns aos outros assim
como Eu vos amei. Por isto é que todos conhecerão que sois meus discípulos: se
vos amardes uns aos outros» (Jo 13, 34-35). Esta é a boa nova que
requer, de cada um, um passo mais, um exercício perene de empatia, de escuta do
sofrimento e da esperança do outro, mesmo do que está mais distante de mim,
encaminhando-se pela estrada exigente daquele amor que sabe doar-se e gastar-se
gratuitamente pelo bem de cada irmão e irmã.
Cristo abraça todo o ser
humano e deseja que ninguém se perca. «Deus não enviou o seu Filho ao mundo
para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele» (Jo 3,
17). Fá-lo sem oprimir, sem forçar ninguém a abrir-Lhe as portas do coração e
da mente. «O que for maior entre vós seja como o menor, e aquele que mandar,
como aquele que serve – diz Jesus Cristo –. Eu estou no meio de vós como aquele
que serve» (Lc 22, 26-27). Deste modo, cada actividade deve ser
caracterizada por uma atitude de serviço às pessoas, incluindo as mais
distantes e desconhecidas. O serviço é a alma da fraternidade que edifica a
paz.
Que Maria, a Mãe de
Jesus, nos ajude a compreender e a viver todos os dias a fraternidade que jorra
do coração do seu Filho, para levar a paz a todo o homem que vive nesta nossa
amada terra.
Vaticano,
8 de Dezembro de 2013.
FRANCISCUS